A medição TTL: medir é comparar
Como entender a fotometria e não depender do padrão cinza 18%
O que é o TTL?
O conceito não poderia ser mais simples: todas as luzes do Universo serão calibradas por apenas um padrão, depois de percorrer apenas um caminho:
A sua lente.
Lembre-se de que você é um dosador da vazão de luz na sua câmera, essa dosagem será sempre feira por comparação.
Poucos compreendem a genialidade por trás disso:
Entenda apenas um conceito e controle a entrada de qualquer fonte luminosa.
É impossível ser mais simples, sua câmera fará apenas um ação eternamente e, por isso, a chamam de máquina:
máquina
substantivo feminino
1. Engenho destinado a transformar uma forma de energia em outra e/ou utilizar essa transformação para produzir determinado efeito.
2. Qualquer equipamento que empregue força mecânica, composto de peças interligadas com funções específicas, e em que o trabalho humano é substituído pela ação do mecanismo
Deixaram uma máquina repetindo para que o cérebro se concentrasse no que faz de melhor: julgar.
Há uma razão para essa obsessão por simplicidade, quando a câmera escura ganhou uma lente, havia poucas pessoas em toda a Europa capazes de entender que um número (chamado f/) era a razão entre a distância focal e o diâmetro da abertura de uma lente.
Se é complicado hoje, imagina em 1.550, a Lei do Inverso do Quadrado nem existia!
Todas as luzes estão em TTL
Seres humanos só conseguem medir alguma coisa comparando-a com um padrão calibrado e reconhecido internacionalmente. Um dos mais usados é o metro, tem endereço e tudo:
Rua Vaugirard 36, Paris.
Foi em uma prateleira de mármore naquela rua em 1791, em plena Revolução Francesa, que fixaram o “mètre étalon” (o medidor padrão). Entre as duas marcações de bronze, nascia o metro que você guarda na caixa de ferramentas hoje.
Qual seria o nosso “mètre étalon" na fotografia? Qual o padrão com que comparamos para dimensionar a quantidade de luz necessária para a exposição da sua foto?
O Cinza 18%
Para a sua câmera o mundo ao seu redor é um ambiente chatíssimo, ultra monótono que só é capaz de refletir 18% de qualquer luz que incida sobre ele, é quase um pensamento budista, literalmente o tom de cinza que está no meio do caminho entre o 3,5% de preto e o 95% de branco.
Faça uma rápida abstração e imagine todos os tons de cor em suas escalas indo do mais escuro ao mais claro, pronto, aí está o seu padrão calibrado para todas as cores.
Monótono
.Que não sofre variação ou não demonstra novidade, tornando-se maçante; enfadonho.
.Repetitivo; que se repete incessantemente; invariável.
.De um tom único; uniforme, sem variação.
Só de ler a definição entende-se a razão de colocarem uma máquina para fazer isso, não?
Toda a energia luminosa que escoa pela objetiva ( batiza o"TTL-Through the Lens", ou através da lente, em português) é comparada a esse tom médio e sua câmera fará todo o ajuste possível para que a sua foto tenha sempre aquela mesma tonalidade.
Qualquer quantidade de luz é sempre comparada com um único tom, impossível simplificar mais, não consigo entender como complicaram tanto uma idéia voltada para a versatilidade e proteção do fotógrafo.
O sistema tem uma brecha muito importante: se o padrão 18% está no meio da escala e cada variação de tom equivale ao dobro de luz, por quê os fabricantes de câmera não calculam os limites da tabela, indicando todos os tons certos?
Porque não seriam os tons que você acha certo!
O máximo de tecnologia do modelo mais atual apenas refina o que sua câmera foi projetada para fazer: apresentá-lo ao medíocre, ao vulgar.
É você que decide quanto quer se afastar dele. O TTL oferece a única coisa de que seu cérebro precisa para tomar uma decisão: um ponto de contraste.
Não importa qual é o ponto de medição, mas sim que há uma referência, da qual você pode discordar livremente. É justamente nessa decisão que nasce o fotógrafo!
Zerar o fotômetro não é sinônimo de exposição perfeita, mas de um acordo com o mediano.
Girar os dials de abertura e velocidade do obturador até que o fotômetro se mova até o "zero" não poderia estar mais longe do que é expor uma foto e não estranho a total dependência de softwares de edição, boa parte das chamadas para cursos de lightroom e photoshop apresentam fotos mal expostas e enquadradas, facilmente corrigidas na hora do disparo.
Você cria sua foto a partir de duas possibilidades: o controle da profundidade de campo (abertura) ou a percepção do movimento (velocidade do obturador).
Num retrato, por exemplo, ao determinar que minha modelo será fotografada em f/2.8, afirmo que quero atenção total nela. Uma vez fixada a abertura, o contraste ideal será alcançado alterando os valores da velocidade do obturador, do tempo que a luz toca no sensor.
É você quem decide onde quer chegar, não há uma polícia secreta punindo fotógrafos.
Polaroides cercavam a exposição na época do filme, pelo bracketing, variação intencional da exposição, a foto perfeita era alcançada, processo idêntico é feito nas digitais antes da captura e agora, com as mirrorless, chegou-se no mundo perfeito:
A visualização da exposição correta é feita antes da foto ser criada!
Não há mais desculpas para uma foto mal exposta.
Assim como aconteceu com o ISO, o conceito de exposição e a necessidade de corrigi-la estão com os dias contados.
A idéia de acertar a exposição em um único clique é absurdamente insana, a única forma de seu cérebro tomar decisões corretas é tomando decisões erradas, sua câmera não só perdoa como estimula o erro, é justamente naquele friozinho antes de clicar, na decisão de onde estará o tom desejado, que brota a sua fotografia.
Suas primeiras 10.000 fotografias serão as piores. (Cartier-Bresson)
Caso queira, aqui é um bom ponto para dar um suspiro e continuar a leitura, seguiremos com exemplos práticos a partir do próximo parágrafo
Quero que me acompanhe em alguns exercícios fáceis, quero que os faça aí na sua casa também.
O primeiro teste consiste em tirar uma foto de uma parede branca, sim, uma simples parede branca iluminada apenas pela luz natural, sem o uso do flash, para que todos possam acompanhar com tranquilidade e fazer o teste.
O visor da câmera foi preenchido pelo tom branco e zerei a exposição “perfeita” recomendada pelo fotômetro, como se pode observar na foto acima, use qualquer combinação que queira, concentre-se em “zerar a reguinha”
A imagem mostra claramente uma parede cinza e não um branco neve como a do meu quarto ( repare no histograma de sua câmera, ele estará com um pico no centro....).
Foi o fotômetro que errou? Os japoneses da Nikon cochilaram em algum ponto na produção de uma câmera de mais de 2.000 dólares ou algo está acontecendo que eu desconheço?
NÃO! Sua câmera e fotômetro estão totalmente certos!!
Ao apontar a lente para a parede branca e zerar o fotômetro, eu pedi que a dose de luz entrando na câmera fosse suficiente para reproduzir um tom médio e não o branco, e ela, como o instrumento de precisão que é, cravou o resultado.
Quem olhar a foto acima concordará que a parede está cinza e não branca, mas haverá 7 bilhões de divergências sobre o quão branco ela deve ser. A Fotografia é inclusiva, aceita todas as opiniões possíveis.
É justamente nesse vazio entre o mediano e o que se deseja que nasce a sua Fotografia.
É nessa subjetividade que todas as opiniões e vontades se encaixam, você é levado com precisão até ao monótono, mas deve e pode se afastar dele, o quanto quiser!
Voltando ao teste…eu refiz a foto, abrindo o diafragma para que mais luz atingisse o sensor.
Observe a nova exposição, o fotômetro indica uma superexposição de 1 e 2/3 de stop acima da recomendada, o tom está ficando cada vez mais claro até perder todos os detalhes, basta deixar mais luz entrar.
Estamos em um extremo da escala de contraste, no branco, será que na outra ponta ocorre algo parecido? É hora de fazermos um segundo teste, desta vez fotografando algo em um tom bem escuro:
Não é nem de longe a imagem de um tecido preto, mas de um cinza (e só por curiosidade: compare com o cinza do teste anterior, veja como estão bem próximos).
Como falei no primeiro teste, o fotômetro de sua câmera só sabe fazer uma coisa: apontar-lhe qual será o tom médio de sua foto.
Quando enchi o quadro com o tom escuro e zerei o fotômetro, novamente a câmera pensou que eu queria um cinza e não um preto, deixando que mais luz entrasse pela objetiva, “lavando” o preto até que se chegasse ao tom de cinza médio.
O problema é que você é ensinado a se apoiar no julgamento limitado do fotômetro, quando antes mesmo de clicar já se sabia de antemão que aquilo não era cinza, que jamais deveria parar no meio, e sim seguir para o tom que eu desejo
Os dois testes acima foram feitos somente com luz natural, mas o que acontece quando não há luz disponível e dependemos do flash para iluminar corretamente nossas imagens?
E o flash em TTL?
Hora de mais dois testes, usando a mesma parede e o mesmo tecido preto, só que dessa vez, eles serão iluminados apenas por um SB-910 no topo da câmera.
Nesse teste eu preciso eliminar a presença da luz natural, como escrevo essa parte do texto à noite, foi uma tarefa relativamente fácil: em ISO 100, com f/5.6@ 1/250 s e, ainda sem o flash ligado, a foto acima mostra a minha parede “branca”:
Aqui não há erro algum de fotômetro, não houve tempo suficiente para a luz sensibilizar o sensor da câmera. O “cão” vai entrar em ação!
Liguei o SB-910 no modo TTL, me certifiquei de que estava dentro dos limites expressos no painel e disparei ( faça esse teste!). Observe a imagem resultante:
Ok, esse disparo aconteceu na velocidade da luz, é aqui que muitos fotógrafos tropeçam, mas vou tentar explicar com palavras o diálogo entre flash e câmera:
(SB-910) – Sra. Nikon D4, essa é uma parede, o que a senhora quer que eu faça?
(D4) – Ora, Sr. Sb-900, a única coisa que eu sei fazer, mas não estou conseguindo por conta desses ajustes da exposição. O senhor poderia iluminar essa parede de forma que ela se pareça com um cinza 18%?
(SB-910) – Claro! Isso é moleza para mim!
E velozmente cordiais, câmera e flash se ajustam para transformar uma parede branca em cinza. O SB-910 despejou menos luz do que era desejado por você….humm..a primeira experiência já nos mostrou a resposta para esse problema, basta abrir mais a abertura e eu volto a ter o branco, não é?
NÃO É?
Pois bem, eu vou extrapolar e tentar uma nova foto, dessa vez com o diafragma 2 pontos mais aberto, em vez de f/5.6, vou usar f/2.8, eu quero um branco sem textura, veja o resultado na imagem abaixo:
Oh..oh…algo está errado! As duas fotos estão idênticas, mesmo eu tendo escancarado a abertura para deixar mais luz entrar no sensor….só que não há mais luz para entrar no sensor, sua foto depende exclusivamente da iluminação vinda do flash!!!
Eis o que eles falaram no momento do disparo:
(D4) – Senhor SB-910, nosso ilustre fotógrafo agora ajustou a abertura para f/2.8, abriu dois pontos, o senhor poderia recalcular e deixar sua lâmpada acesa por um tempo menor ainda?
(SB-910) – Claro! Isso é moleza para mim
Como eu ainda estou enchendo o quadro com um tom diferente do cinza médio, câmera e flash se ajustam mutuamente para manter o padrão sempre, qualquer que seja a abertura que se utilize, nesse caso o speedlight despejará uma intensidade menor do que a esperada.
A sorte de todo o sistema, tanto da câmera quanto do flash, é que eles contam com um acessório único no universo, capaz de enxergar, analisar, julgar e discordar do que é proposto pelas máquinas:
seu cérebro!
A base de todo o pensamento TTL É a divergência.
A solução mais básica é aumentar a intensidade diretamente no flash, já que é ele que está comandando a iluminação. Refiz as duas fotos, com as mesmas exposições, só que agora o flash estava ajustado em +1,7.
O branco que eu desejava apareceu, vamos ver como se comportam câmera e flash quando utilizados para fotografar o mesmo tecido preto colado na parede.
Vou fazer as mesmas fotos com as exposições em f/5.6 e f/2.8, com o flash sem alteração alguma, veja o resultado abaixo:
Nenhuma das duas fotos mostra o tom correto do tecido preto, estão ligeiramente estourados, o SB-910 usou um tempo maior de lâmpada acesa do que deveria para iluminar a cena, tentando levar o preto próximo ao cinza.
Vamos ver o que acontece quando diminuo em -1,7 a intensidade do flash, acompanhe as 2 imagens, feitas nas mesmas exposições anteriores:
Agora sim!
Um tecido preto corretamente exposto com um leve ajuste de compensação diretamente feito no flash. Por mais que o fotômetro de sua câmera teime em trazer a imagem para um tom médio, a correção no flash desfaz o desentendido e corrije a exposição da cena.
Mas então em um casamento ou um show, por exemplo, onde os tons passam longe do cinza médio eu preciso ficar controlando a intensidade do flash a todo instante, isso não deixa o fotógrafo mais lento?
De certa forma sim, mas há uma forma de contornar o problema que é usar o “spot meter” de sua câmera para travar a exposição no tom médio certo e todos os outros tons da imagem “caem” nos lugares certos.
Eu fiz o seguinte: imprimi a imagem do cinza que apareceu lá em cima no primeiro teste e colei na parede branca, fotografei usando o modo pontual no cinza, aqui está o resultado:
Agora colei a mesma impressão no centro do pano preto e refiz a mesma exposição, todas as 2 fotos com a compensação do flash zerada, observe a foto resultante:
Como concentrei a exposição no centro do retângulo acinzentado graças ao modo “spot meter”, a comparação da luz da cena foi feita em um padrão cinza 18% e o flash foi disparado na intensidade correta, trazendo todos os tons restantes para seus respectivos lugares, sem qualquer ajuste no speedlight.
Todas as câmeras atuais trazem o “spotmeter” entre os modos de medição de luz e muitas delas ainda contam com um botão com a seguinte inscrição “AE-L/AF-L”.
Essas siglas significam: “Auto Exposure Lock/ Auto Focus Lock”, ou seja, uma vez apertado, ele trava a exposição e/ou o foco no tom que vc escolher, seu trabalho em um casamento, por exemplo, onde o flash é praticamente indispensável, é buscar o tom correto ( muitas vezes o rosto dos noivos, mas se eles forem negros ou muito brancos, a compensação deverá ser feita) e travar sua exposição ali.
Sim, você terá que apertar alguns botões a mais, mas garante um rendimento melhor de suas fotos e horas a menos na edição e tratamento sacais na frente de um computador.
Nesse vídeo eu mostro como escapar da vigilância do TTL, usando o flash em manual com uma "malandragem":
Entender como sua câmera expõe uma foto é a chave para o domínio do flash. Os testes acima são facílimos de serem repetidos, eu aconselho que vocês treinem e entendam os conceitos antes de partirem para um trabalho específico.
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Eu recomendo fortemente a visualização desses dois vídeos, o primeiro mostra a idéia do TTL e toda a simplicidade do seu pensamento, o segundo revela uma técnica rápida caso vc tenha dificuldade de encontrar um ponto ideal para fotometrar, usando algo que está sempre à mão:
A sua mão! 😀
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Sensacional!!! Uma verdadeira aula de iluminação, fotografia... Parabéns!!!